Por Virgilio Marques dos Santos*
Hoje falarei sobre o desafio intergeracional no trabalho. Até pouco tempo atrás, não ouvíamos falar sobre conflitos geracionais. Dava-se a impressão de que os processos de trabalho e a hierarquia das empresas era algo mais forte. A cultura organizacional se sobrepunha à geracional. Quando entrei no mercado, no ano de 2002, a liderança sênior era Baby Boomers e a média liderança, X. Mas eu, como um Milennial, tinha que seguir as regras impostas pelos processos e aguardar a minha vez na liderança, para implementar o meu jeito. Isso, claro, sempre respeitando os valores da empresa.
Em rodas de conversa entre amigos, quando estagiário, já fiz comentários negativos sobre a postura de profissionais que não gostavam de mudanças. Todavia, nunca de maneira jocosa e sempre com o intuito de melhorar algum processo que para mim não fazia sentido. Muitas vezes, uma boa conversa era o suficiente para entender o porquê de as alterações no processo não serem aceitas ou estimuladas. Havia respeito e admiração.
Você já ouviu falar em etarismo?
Segundo a Academia Brasileira de Letras, etarismo significa: discriminação e preconceito baseados na idade, geralmente das gerações mais novas em relação às mais velhas; idadismo. Confesso que, até pouco tempo, não conhecia essa palavra. Tanto é que, ao buscar no dicionário Michaelis, não a encontrei, ou seja, é algo novo. Diante disso, uso esse artigo para propor uma reflexão sobre esse “conflito” de gerações: será que existe mesmo?
Se sim, por que é algo que só se manifestou recentemente? Na minha percepção, a conexão das redes sociais acentuou o cenário. Hoje, pela imersão nas redes, um jovem passa mais tempo conectado do que em seu trabalho atual. Por isso, a conexão com os seus se torna mais forte do que a presença na empresa. É como se a bolha das pessoas da sua geração, parecidas com você, estivesse mais presente em seu dia a dia do que a bolha dos profissionais da empresa em que trabalha.
Inclusive, se pensarmos no modelo de trabalho híbrido ou remoto do pós pandemia, essa hipótese é mais firme ainda. Simplificando algo complexo, é como se a ilha na qual você passava 9 a 10 horas da sua vida não fosse mais a empresa e sim, a sua casa. E a sua casa talvez não fosse mais o ambiente que minha geração viveu. Na minha, apesar de estar em casa, tínhamos contato com nossos pais e irmãos em horas específicas, sempre. Não era uma possibilidade fazer as refeições ou trancar-me no meu quarto, conectado com o mundo exterior apenas por uma tela.
E a tela, quando aparecia no formato de televisão, era relativamente controlada – seja pelos programas infantis incríveis produzidos pela TV Cultura, seja pelos programas vistos em família ou até pelos jogos de videogame verificados por minha mãe. Hoje, é possível inserir-se num ambiente remoto restrito que retroalimente opiniões que, se submetidas à uma curadoria, seriam rapidamente dissuadidas. Nessa linha, penso ser importante sairmos da bolha e estruturarmos, mesmo que de modo genérico, as características das diversas gerações e avaliarmos como poderiam ser complementares, propiciando um ambiente de trabalho prazeroso, produtivo e equilibrado.
Quais as características das diversas gerações no trabalho?
Para fomentarmos a reflexão sobre como cada geração pode contribuir para um ambiente de trabalho plural, vamos começar pela elaboração de uma tabela com as principais características de cada uma delas:
Por fim, convido cada profissional a uma análise da tabela. Como exemplo, chamo a atenção para os estilos de liderança de cada geração e pergunto: a sua empresa está adaptada para todas as gerações e pessoas? Ou melhor, nela é possível conviver com os diferentes perfis? Há espaço para uma liderança inspiradora, orientada por objetivos? E para alguém que se sente mais confortável em delegar mais? É possível que os estilos coexistam; entretanto, a empresa deverá ter um processo que permita as adaptações.
Em nosso caso, utilizo gestão à vista, orientada por objetivos. Mas há líderes na empresa que preferem uma liderança mais colaborativa, focada no consenso. Por fim, deixo claro que, apesar de extensa, a tabela não é uma regra fixa, mas seu uso pode trazer bons insights. Por isso, convido vocês a olharem para tabela e refletirem: como aproveitar as oportunidades que esse caldo de cultura pode trazer?
—
*Virgilio Marques dos Santos é um dos fundadores da FM2S, doutor, mestre e graduado em Engenharia Mecânica pela Unicamp e Master Black Belt pela mesma Universidade. Foi professor dos cursos de Black Belt, Green Belt e especialização em Gestão e Estratégia de Empresas da Unicamp, assim como de outras universidades e cursos de pós-graduação. Atuou como gerente de processos e melhoria em empresa de bebidas e foi um dos idealizadores do Desafio Unicamp de Inovação Tecnológica.